Debate na Hora do Planeta foca na restauração de ecossistemas
No Festival Digital da Hora do Planeta 2022, principal movimento ambiental global da rede WWF, realizado em 26 de março, a primeira atividade foi uma mesa de debates com o tema “Restauração de Ecossistemas: Por que esse é o caminho para um futuro mais saudável e justo?”.
Para discutir o assunto foram convidadas Alice Pataxó, embaixadora do WWF-Brasil, comunicadora e ativista indígena, Flávia Balderi, cofundadora da Associação Copaíba e Ana Rosa Cyrus, pedagoga, diretora-executiva do Engajamundo. O debate girou em torno da construção de um presente e um futuro em harmonia com a natureza.
A ativista Alice Pataxó falou sobre a importância da restauração dos ecossistemas para os povos indígenas. “É preciso entender que o que é restaurado não é somente o território, mas a vida – e não só dos indígenas, mas de todos”, disse. Nos territórios indígenas, a restauração deve ser prioritária, na visão de Alice, por ser indispensável para a relação cultural e de subsistência desses povos, que da terra tiram a alimentação e remédios, por exemplo. “A relação é de coexistência com a natureza, de viver em harmonia com ela. Queremos que as pessoas aprendam que isso é possível, mesmo nos centros urbanos”, diz.
Envolver as pessoas é fundamental no trabalho de restauração, afirma Flávia, da Associação Copaíba, que atua há mais de 20 anos na restauração florestal em municípíos dos estados de Minas Gerais e São Paulo. Segundo ela, no processo de transformar áreas degradadas em florestas, a Copaíba realiza atividades de sensibilização ambiental e vivências ambientais para mostrar a importância da conservação e restauração para o dia a dia das pessoas. “É preciso conseguir quebrar a barreira, trazer as pessoas para perto, para mostrar que o trabalho de restauração florestal vai trazer benefícios para as pessoas”, diz.
Flávia afirma que a restauração é importante na estratégia de adaptação climática. “A árvore ajuda nesse processo, desde a captação de gases de efeito estufa como na mitigação de eventos extremos, como deslizamentos, enchentes”, diz. Para ela, falar de restauração é falar de economia, redução da pobreza, além de segurança hídrica e alimentar.
Em algumas áreas de restauração, é possível ver resultados práticos rapidamente. “Tivemos casos em que nascentes de água ressurgiram após três anos”, conta Flávia. Mas, ela observa que, em geral, os serviços ecossistêmicos começam a retornar 15 anos após o início do projeto de restauração. “A gente começa a restaurar ciclos e a vegetação vem com mais força. É legal ver a vida voltando a ambientes em que ela não existia mais.”
Ao olhar para a restauração de ecossistemas, é interessante aproveitar a oportunidade para repensar a própria sociedade, na visão de Ana Rosa, do Engajamundo. “Territórios são degradados dentro de uma lógica que dá poder para determinados grupos”, diz. Nesse contexto, não são considerados processos culturais, saberes, práticas, cultura e vida de ambientes das periferias urbanas, observa Ana. “Temos que olhar para a ideia da restauração de forma múltipla, complexa, consideramos os corpos distintos.”
Jovens na luta pelo seu futuro
As pautas ambientais hoje têm uma participação significativa da juventude, afirma a ativista Alice Pataxó. “Tem uma galera que está engajada, que quer fazer a diferença”, disse. Na visão de Alice, é a primeira vez na história que a juventude é entendida como um movimento político, com espaço de liderança e fala. “É um grande momento. Espero que essa força venha a crescer cada vez mais. Somos nós que vamos fazer a diferença.”
Para Ana Rosa do Engajamundo, ativistas cada vez mais novos estão à frente da luta porque precisam lutar para combater as violências que a juventude hoje sofre. “Os jovens sentem necessidade de fazer algo para buscar respostas a problemas como a falta de emprego, a comida na mesa, de educação”, exemplificou.
No Engajamundo, ONG voltada à aproximação política de jovens pela conscientização, ativismo e mobilização, os jovens são orientados a ter autonomia na luta de suas causas. “As juventudes são plurais. São demandas diferentes, pautas distintasm que precisam ser colocadas em foco”, disse.
Para Flávia, da Copaíba, o jovem deve ser protagonista nos projetos de restauração de ecossistemas. “A juventude tem uma força de mudança e engajamento. Por isso, temos que fazer com que esse movimento seja a cada dia mais forte”, disse. Flávia conta que fundou a Copaíba com outras três jovens- todos tinham entre 16 e 18 anos.
Restauração urbana
As participantes do debate falaram sobre a importância de entender que a restauração de ecossistemas não está limitada a plantio de árvores ou áreas florestais. Ambientes urbanos também podem ser restaurados – e as pessoas que vivem nas cidades tem um papel importante nesse processo.
Flávia, da Copaíba, explica que restaurar áreas verdes urbanas pode trazer diversos benefícios , como a regulação da temperatura e oferta de ambientes para a fauna. Mas, além de plantar árvores, é preciso repensar as práticas, na visão de Flávia. “É preciso buscar maneiras de impactar menos o ambiente, considerando a produção do município onde você está. Pensar em consumo mais consciente, em intensificação da agricultura familiar. Até as pequenas atitudes contribuem para a conservação do planeta”, defende.
Cobrar o poder público é fundamental para que o ambiente seja conservado e restaurado nos ambientes urbanos, na visão da ativista Alice Pataxó. “Nós, como sociedade, precisamos estar atentos aos problemas sociais, não só ambientais, que tem relação com a degradação da natureza. Precisamos cobrar os representantes para que façam ações que mudem a sociedade. Essa representatividade, essa luta, é urgente”, disse.
Ana Rosa, da Engajamundo, chama atenção para os planejamentos da cidade, que precisam refletir as demandas da população. “Precisamos de lideranças que escutem as pessoas, para que a cidade seja um espelho do que somos”, defendeu. Ana convida para a reflexão: “A quem esse planejamento urbano serve? Para quem as cidades são feitas? Não faz sentido que esse espaço não sirva para as pessoas que nelas vivem.”
A educação ambiental é uma porta essencial para o diálogo, pois insere as pessoas num processo de participação, com olhar crítico e análise histórica, na visão de Ana Rosa, da Engajamundo. “O processo educativo desenvolve um sentimento de conexão e quebra a hierarquia do saber”, disse.
O vídeo do debate está disponível no canal do WWF-Brasil no Youtube.